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É inegável o quão marcante foi o episódio de "Game of Thrones" no qual Ned Stark partiu dessa pra uma melhor - contrariando muitas expectativas, a série passou a espada na cabeça do protagonista da temporada e declarou, de forma dura, que a história era sobre algo muito maior do que qualquer personagem.

Apesar de não ter sido a primeira grande morte de um protagonista nas telas, foi uma atitude que repercute até hoje nos modos em que as narrativas seriadas vêm sendo pensadas. A morte de Ned foi ao ar no dia 12.06.2011 e, até agora, ainda estamos tendo que nos acostumar à arte do homicídio de personagens principais - cada vez mais presente em diversas narrativas.

E olha que não estamos falando de morte do episódio final, estilo Walter White. Estamos nos referindo a óbitos no meio da trama, é do nada mesmo..!


Existe uma teoria que propõe que se não fosse a morte a cima, não teríamos que ter passado pela metade do que passamos nos últimos anos na televisão. Pensando nisso, aqui vão alguns dados de séries que não estavam nem aí pro elenco principal. 

Em setembro de 2011, "Two and a Half Men" voltou ao ar para sua 9ª temporada. Porém, quem não retornou foi o ator Charlie Sheen, que foi demitido e completamente afastado da série (só era lembrado nas falas das personagens). No lugar dele, Ashton Kutcher foi contratado para protagonizar, ao lado de Alan (Jon Cryer), os novos conflitos ao longo dos episódios - que duraram quatro temporadas (até 2015) e acabaram por remodelar bastante a série.

A Netflix decidiu entrar na onda dos extermínios e, na segunda temporada de "House of Cards", lançada em 14.02.2014, não esperou nem dois episódios para mandar uma das personagens com mais destaque durante a primeira temporada dessa pra uma melhor. Claro que não é a mesma coisa que matar o Frank ou a Claire, mas já é a demonstração de um interesse por parte de roteiristas em contar histórias mais focadas no universo na qual elas existem do que pelas personagens que nelas agem.




Na série "The 100" (2014), a humanidade vive no espaço e envia 100 adolescentes para testar uma Terra "destruída por radiação". Apesar de segurar o elenco na primeira temporada, com mortes a rodo, mas um núcleo principal sólido, o hiatos da segunda temporada (ainda em 2014) foi marcado pela morte de um protagonista (que, inclusive, mantinha um triângulo amoroso com outras duas personagens). A partir daí, a série mostrou que compactua com a mentalidade de "Game of Thrones", no que se refere a não podermos nos apegar a ninguém.

Apesar de "GoT" não ter inventado esse tipo de enredo, com certeza a história de George R. R. Martin soube trabalhar e exercitar essa artimanha. Fica evidente o aumento de séries que trabalham com a ideia de universo da narrativa, em oposição à perspectiva de narrar através de uma personagem específica (Dexter, House, Weeds, por exemplo).

Neste sentido, é interessante pensarmos em "Lost", pois sempre foi uma série com elenco grande e muito uso de suspense e surpresa. Por outro lado, manteve seu grande elenco principal durante as seis temporadas, matando um aqui, outro ali - mas nada que chegasse perto do que vemos em "Game of Thrones". Pra época, sim; já era muito chocante perder algumas personagens queridas, lembro de chorar muito durante a última morte de Charlie, e na chacina de Michael (em que ele tirou de nós Ana Lucia e Libby). Mas, ainda assim, não acho que se "Lost" fosse produzida hoje depois, e de "GoT", tantas personagens teriam sido mantidas da primeira à ultima temporada.

O início de 2015 foi marcado por uma estreia da Netflix que se propôs a complexificar essa relação. Em "Bloodline", somos apresentados à uma família cheia de questões através de um protagonista que morre ao final da primeira temporada. Com a terceira leva de capítulos estreando ainda este ano, fica mais perceptível o hibridismo no formato do roteiro que soube aproveitar bastante o lado pessoal e subjetivo da trama através de um maior protagonismo no início - mas que se mantém dentro da ideia apresentada aqui de uma história que não se propõe a ser sobre uma pessoa específica, mas sobre todas as relações dentro daquele universo apresentado.

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Também no começo de 2015, a trajetória das narrativas seriadas televisivas em relação às mortes de protagonistas atinge um novo nível com uma das mortes mais polêmicas da história das séries: a de Derek. "Grey's Anatomy" é maravilhosa para analisar essa questão, pois sempre foi conhecida por arrancar até a última lágrima das pessoas com mortes de personagens muito queridas. Por mais que isso tenha sido uma marca desde seu começo, um elenco mais principal acabou se estabelecendo e as eventuais saídas aconteceram principalmente por causas contratuais do que por uma verdadeira necessidade/vontade por parte da narrativa. Inclusive, essa é uma das explicações para a saída de Patrick Dempsey. E a série sempre se manteve, principalmente, através da personagem de Ellen Pompeo. Mas a morte do "McDreamy" continua como algo surpreendente.

No entanto, não só em questão de narrativa "Grey's Anatomy" é marcante; também como exemplo de um público que, assim como a TV, está passando por uma transformação. Por mais críticas que tenham existido sobre o afastamento eterno de Patrick Dempsey do elenco, a série já está na segunda temporada sem o personagem e confirmada até 2018. Muito diferente do que aconteceu em 2006/2007 com "The OC" - na qual a terceira temporada foi marcada pela morte da coprotagonista, Marissa, e teve uma quarta temporada rejeitada por fãs, que levaram a série para um eventual cancelamento.

Em contrapartida, "The Vampire Diaries" é uma séries recente, na qual Nina Dobrev (atriz que interpreta tanto a protagonista, quanto uma das melhores vilãs), decidiu sair ao fim da sexta temporada, levando a série ao fim duas temporadas depois. O último episódio com Elena foi ao ar em maio de 2015, mas os showrunners decidiram continuar com a história - o que deu pouco certo, já que a trama, desde sempre, teve a característica do foco na personagem, de contar uma história que, assim como um diário, é muito pessoal. Até existiu um esforço por parte de roteiro em trazer de volta os conflitos típicos de "The Vampire Diaries", mas a necessidade de relembrar a existência da personagem "falecida" nunca foi embora, até o episódio final; no qual ela deu a graça pela última vez - inclusive, fechando as oito temporadas com uma narração em off e provando sua relevância e o quão era essencial.

Agora, trazendo mais um contraponto, se pegarmos como exemplo os rumos tomados a partir da sétima temporada de "One Tree Hill" podemos perceber que, muito antes de "Game of Thrones", a ausência de personagens protagonistas não era motivo para o abandono de uma história. Diferente de "The OC", "One Tree Hill" perdeu seu casal protagonista em maio de 2009, mas durou por mais três temporadas, até 2012. Com um salto grande de tempo e adição de novas personagens para se relacionar com as já conhecidas, "Lances da Vida" hehe soube se reestruturar e também apendeu a dividir melhor o protagonismo.


Por último, só nos últimos quatro meses, já perdemos mais dois "protagonistas" de séries muito queridas. Em novembro de 2016, vimos a grande revelação de que "Wes" havia sido a vítima do último assassinato em "How to Get Away with Murder". Por mais que a série sempre tenha trabalhado com mortes, ninguém tão fundamental para o enredo havia morrido até agora. A série parece se desenvolver no sentido de contar uma história para além das personagens (será que Annalise Keating vai sair ilesa disso)?

E o óbito mais recente, e muito doloroso, aconteceu agora, em fevereiro, no décimo episódio da terceira temporada de "Jane the Virgin", no qual tivemos que nos despedir de um dos personagens mais fofos: Michael Cordero, também par romântico da protagonista. 

Será que todas essas mortes poderiam ter sido evitadas se "Game of Thrones" nunca tivesse existido? Ou será que as mortes também significam uma maior complexidade narrativa, inerente às tramas?




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